Física em Interstellar

Interstellar é muito interessante e  provocante – você certamente fica pensativo sobre; seja pelos aspectos fascinantes da física quântica demonstrados, seja pelo drama, ou ainda pelo realismo pertubador do cenário “apocalíptico” da Terra.

Como em todo filme de ficção científica, os nerds de tocaia rapidamente irão apontar as imprecisões científicas dele. Vou contribuir com minha parte – mas resumidamente:

O filme é muito bem embasado cientificamente. No máximo, ele exagera ou omite uma coisa ou outra pelo bem da narrativa.

 

A produção contou com Kip Torne – um famoso pesquisador sobre efeitos gravitacionais – como consultor técnico, e o Nolan (diretor) tentou manter o filme o mais realista possível – usando como ponto de partida o conhecimento científico, ao invés de suas próprias idéias; apesar de ter deixado claro que iria abandonar esta abordagem se julgasse necessário. Felizmente, não foi – quando o assunto é física, a realidade é tão bizarra e atraente que não é preciso exagerar.

Garantua – o buraco negro fictício exibido no filme –  é a simulação mais realista destes objetos já produzida. Um time de trinta animadores passou um ano construindo este buraco, utilizando extensivas fórmulas e representações fornecidas pelo Torne como base.

Eu emiti sons quase sexuais vendo este buraco negro. Que coisa linda, gente.

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representação, fornecida pelo Thorne, de como um buraco negro distorce o espectro de luz ao seu redor.
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rascunho de uma renderização do buraco negro, que não pode ser visto diretamente, mas tem seus contornos demarcados pelo disco de acreção.

Enfim, os problemas

Estes são os “problemas”, do ponto de vista científico, que notei ao longo do filme. Vale ressaltar que de forma alguma acredito que estes aspectos diminuam o valor da obra.

Dilatação de tempo

Em um dos planetas, o espaço-tempo é de tal forma dilatado que uma hora equivale a vários anos de tempo “na Terra”.

Isso é perfeitamente possível, mas não em um planeta tão distante do buraco-negro – para experimentar um efeito de dilatação tão severo seria necessário estar muito, muito mais próximo do buraco-negro.

Ondas

Este mesmo planeta é predominantemente oceânico, e possui frequentes ondas gigantescas . Apesar delas serem teoricamente possíveis, não poderiam ser causadas por um buraco negro deste tipo.

Ondas são causadas por forças de maré (tidal forces), que surgem quando a gravidade  de um objeto afeta um corpo (neste caso um oceano) de forma desigual. Por isso temos ondas na Terra, por exemplo – a Lua “puxa” a superfície dos oceanos mais próximos de si. O lado da Terra mais próximo da Lua experimenta “maré alta” enquanto o outro está em “maré baixa”, e este constante movimento da superfície oceânica gera ondas.

O ponto é que um buraco negro supermassivo como aquele é tão grande que afeta os objetos ao redor com uma força uniforme. Ou seja, mesmo que sua força gravitacional seja imensa, ela estaria sendo aplicada uniformemente ao longo de toda a superfície do planeta; então ondas não surgiriam.

Ou seja, o mesmo fator que permitiu a sobrevivência de Copper garante  que ondas gigantes não deveriam acontecer.

Sabemos que este buraco negro é supermassivo pelo fato de ser possível “entrar” nele. Se ele fosse menor, possuiria forças de maré e destruiria um objeto tentando se aproximar dele em um processo chamado de “espaguetização” (que comentarei sobre eventualmente). Como o Copper conseguiu “passar” pelo buraco negro sem ser destruído, este é supermassivo, logo não possui forças de maré e não deveria causar aquelas ondas.

Foguetes e aeronaves

As aeronaves exibidas certamente precisariam de foguetes ou motores maiores do que os mostrados. Além de – principalmente – precisarem de tanques maiores de combustível.

Nuvens gélidas

No desolado planeta do Dr. Trairagem, existem algumas construções sólidas e “nuvens” de gelo que possivelmente não são fisicamente possíveis dado como o gelo se comporta nestas estruturas e as condições climáticas do lugar.

Soluções tecnologicamente estranhas

Montes de coisas não estão exatamente erradas ou sequer exageradas, mas são…estranhas, pouco intuitivas ou ignoram algumas tecnologias.

Novamente, isso é totalmente compreensível – é uma obra de ficção.

Por exemplo, o plano todo das expedições Lazarus – 12 cientistas, um indo para cada planeta – é bem pouco justificado. Boa parte da tensão narrativa do filme vem da impossibilidade dos astronautas entrarem em contato com a Terra, mas isso seria facilmente resolvido com um sistema de comunicação baseado em partículas entrelaçadas, que possivelmente teremos em alguns anos.

…e é isso – uma lista bem curta, especialmente dado o tamanho do filme e a quantidade de conceitos nele explorados. Isso realmente diz muito sobre o fantástico trabalho da equipe em manter tudo bem fundamentado.

— Matheus E. Muller

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